Mercado de trabalho para especialistas em biomecânica

Ela faz parte da grade curricular dos cursos universitários e é essencial para o dia a dia dos profissionais de educação física. Trata-se da biomecânica, uma ciência que usa instrumentos voltados para a física, uma ciência exata, para analisar o movimento. Julio Serrão é coordenador do laboratório de biomecânica da escola de educação física da Universidade de São Paulo (USP) e conta que a biomecânica tem dois objetivos claros: buscar parâmetros de otimização do movimento – desde os mais simples, como andar, até os mais complexos, como os desportivos; e descobrir o que afeta a sobrecarga para poder preservar o aparelho locomotor, tornar o movimento eficiente e seguro.

Biomecânica e esporte

A relação da biomecânica com o esporte é bastante íntima. Afinal, ela ajuda a adequar processos e também se torna uma ferramenta esportiva eficiente: “a biomecânica avalia e faz o diagnóstico do movimento, que dá subsídio para que as pessoas pensem o que precisa treinar. É preciso ter um mapa do que vai modificar e estudar também os métodos de treinamento. A biomecânica compara o processo e a meta para saber se ele é específico”, conta Serrão.

Em algumas modalidades esportivas esta ciência é usada de forma mais constante para a correção do movimento e a melhora da performance. Serrão cita o atletismo e a natação como dois principais esportes com tradição no uso desta ciência durante o treinamento. Além disso, ela é usada a todo momento para tentar aprimorar o que já existe. “Sempre repensamos como fazer algum movimento, até em função das novidades que são criadas”, conta o profissional da USP.

Quando se trata de esportes de alto rendimento, a biomecânica leva a uma melhora até da tecnologia e Serrão exemplifica as próteses que revolucionaram a prática do movimento, propiciando aos atletas amputados um desempenho superior ao dos atletas “convencionais”. “A natação também, com seus trajes modernos, fez com que se mudasse a técnica, o jeito de se movimentar.”

James Counsilman é citado por Julio Serrão como um técnico de natação que estudava a biomecânica do movimento por meio de filmagens dos treinos e, com isso, transformou a trajetória da braçada no esporte durante a década de 1970. “As pessoas faziam uma braçada mais reta, quase uma remada, e ele percebeu que os atletas de alto nível faziam um movimento diferente, mais lateral e com formato de S. Com essa informação, ele passou a pesquisar o que funcionaria melhor e, recuperando princípios da física, ele configurou a técnica eficaz que alterou a forma como os nadadores dão a braçada.” Atualmente as transformações são menores, mas ainda acontecem e a biomecânica é uma das ferramentas para aprimorar os esportes.

Sinal de alerta

Serrão destaca que um profissional de educação física que não conhece bem as aplicações da biomecânica não tem condições de cumprir bem seu papel e, além disso, é algo temerário, já que erros podem ser bastante graves. A qualidade do ensino também requer atenção, já que muitos alunos chegam à universidade com problemas de formação em áreas base, como a biologia e a física. “O que mais me preocupa hoje, em particular, é que a biomecânica é uma área muito mais nova do que a fisiologia e temos ainda uma quantidade relativamente pequena de pessoas efetivamente capacitadas para dar aula sobre o tema e você encontra instituições no Brasil com profissionais que sequer têm contato verdadeiro ou formação em biomecânica, quando o ideal é que tivessem mestrado e doutorado na área”, alerta.

A busca por conhecimento específico leva a uma diferenciação do profissional de educação física, agregando possibilidades em um mercado que está saturado e carente de especialistas.

Biomecânica: oportunidade de trabalho

Serrão destaca que o esporte tem sido bastante audacioso ao incorporar conhecimento científico às modalidades, já que o Brasil tem pouca vocação para produzir ou aproveitar tecnologia em todas as áreas. O coordenador do laboratório da USP conta que há empresas brasileiras, fabricantes de equipamentos esportivos, que contam com assessoria biomecânica que testam as máquinas que são desenvolvidas baseadas nos princípios científicos.

“A indústria do calçado esportivo usa muito a biomecânica para pensar e desenvolver demandas tanto dos atletas quanto dos praticantes que buscam qualidade de vida. Os calçados novos , com conceito minimalista, não são feitos assim por bobagem: é porque eles sabem que o aparelho locomotor vai responder a esse design e sabem disso porque analisaram o movimento.”

Mas Serrão não acredita que teremos “biomecânicos” e, sim, profissionais de educação física especializados em biomecânica: “a demanda é incrível e em várias dimensões! As indústrias de produção de equipamentos vivem um boom de desenvolvimento, enfrentam a concorrência acirrada do mercado internacional e estão preocupados em desenvolver inovações. Para isso, precisam de profissionais com sólida formação em biomecânica para ajudar nessas criações”.

O ambiente laboral também se mostra receptivo aos profissionais de educação física com especialização em biomecânica. Afinal, é preciso que se avalie e modifique o posto de trabalho, propondo atividades físicas que façam a diferença dentro da companhia. “A época do exercício por exercício passou”, afirma Serrão, e as empresas que se preocupam em oferecer atividades físicas aos funcionários sentem carência de um bom programa laboral. Dessa forma, “um profissional com sólida formação consegue penetrar no mercado que está desbravado, mas que a maioria das pessoas não consegue alcançar”.

O envelhecimento populacional também ganha destaque como oportunidade de trabalho, já que, quanto mais o tempo passa, mais patologias surgem com o desgaste natural do organismo e o profissional que conhece a biomecânica sai na frente ao conseguir propor atividades próprias para esse público.

 

 

Fonte: Por Márcio Santos, em Portal EF

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